domingo, 31 de outubro de 2010

Prece ao Diabo Na Noite das Bruxas

Sugerimos a quem queira ou possa fazer uso delas, essas modestas preces para serem lidas n´algum sabá em que porventura tomem parte. Notem bem que as preces são encadeadas, complementares: para que a Prece ao Diabo Na Noite das Bruxas tenha realmente algum valor (e, portanto surta efeito) nos arcanos, deve-se antes rezar a Invocação inicial, quando se pede ao Pai Eterno, com as devidas justificativas, o direito de se louvar ao Diabo.
 
Peço apenas que as leiam com as devidas entonações litúrgicas.
 
Amém!
 
 
           PRECES PARA A NOITE DAS BRUXAS
 

 

  I  
INVOCAÇÃO AO PAI


 
Por Teu Filho Manuel - a quem também chamam Jesus -
Aquele que andou pelo mundo louvando o amor e o perdão
e nos ensinou a amar aos nossos inimigos
e ainda a oferecer o outro lado da face após o tapa;
 
e por Francisco, o santo homem de Assis
que se irmanava a todas as coisas da Natureza
- Tua arte e criação, meu Pai! - e que amava as mazelas
e abraçava os desesperados;
 
nós, criaturas imperfeitas moldadas á Tua Imagem,
vimos pedir permissão - ó Meu Pai! -
para nessa Noite das Malditas Feiticeiras
fazermos uma pequena prece a Teu servo desgraçado,
aquele anjo que um dia caiu para nunca mais se reerguer
- que triste é o destino dos deuses que caem um dia!
 
E assim em nome de todos eu Te peço - ó Bom Pai -
sacerdote que sou dos asclepíades,
que nos mande algum sinal dos céus caso não permitas
que homenageemos nesta Noite ao triste Lúcifer.
 
Pois se as estrelas permanecerem imóveis e o céu silencioso,
entenderemos que nos foi dada a permissão.
 
E por isso nós cantamos assim:
 
 

                   II
 
 
PRECE AO DIABO NA NOITE DAS BRUXAS



 
Ó Anjo Caído,
humilhado, traído,
ó anjo banido das hostes celestiais;
 
Anjo iluminado foste o mais amado,
mas atraiçoado, triste e humilhado,
vives exilado lá nas trevas infernais...
 
Nessa Noite das Malditas Feiticeiras,
das bruxas, catimbozeiras
que arderam nas fogueiras,
as mulheres rezadeiras querem que cessem teus ais!
 
Tu que do Pai
foste o orgulho outro dia,
aceita a nossa poesia
como bálsamo que alivia
a dor do anjo que um dia transformou-se em Satanás...
 
 
                     Antônio Adriano de Medeiros;
                     [o velho bruxo]

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Coisa de Pele

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

 


O BARÃO DE MOMOICÓ
 
"Data de Momoicó" foi o primiero nome da região sertaneja onde nasci, após o Planalto da Borborema, entre os estados da Paraíba e do Rio Grande do Norte. Depois, em virtude de um rio da região, passou a chamar-se Data do Quipauá, e hoje há quem a chame de Sabugy (na PB) ou de Seridó no (RN). Para criar o Barão de Momoicó me inspirei em Ariano Suassuna, e em pessoas que conheço, inclusive alguns parentes e amigos, além de um personagem clássico da literatura universal que a leitura permite identificar.



O BARÃO DE MOMOICÓ


Meu nome é Klaus Kredul, sou o Barão de Momoicó.


Quando éramos o saudoso Império do Brasil, meu tataravô recebeu
o nobre título de Barão de Momoicó,
em virtude de ter herdado de seu avô
a Data de Momoicó,
pedaço de terra hoje em avançado processo de desertificação
incluindo ainda serras do Planalto da Borborema
e dando início ao sertão nas províncias
da Parahyba do Norte e do Rio Grande do Norte,
que lhes fora dado pelo Rei de Portugal.


Há tempos que alertamos sobre o hoje avançado
e irreversível processo de desertificação
da área que corresponde ao que os tabajaras chamam de Sabugy,
e os potiguaras, de Seridó.


Gosto das coisas antigas e não vejo por que usar gentílicos modernos
para referir-se às pessoas das duas tribos majoritárias
no litoral brasileiro na área das províncias;
eles nunca me deram razão pra pensar que deixaram de ser índios,
e ainda hoje vivem brigando,
como se vê nas diferentes denominações que dão ao meu reino,
quebrando ao meio uma mesma área geográfica
com finalidades que nem geopolíticas são,
mas meramente políticas,
dessa mesquinhariazinha de almas mixurucas;
ao bom leitor, devo dizer que fosse assim o gentílico correto ali seria Caeté,
tribo guerreira de quem não gostamos de lembrar,
inimiga de meus antepassados
e que precisou ser exterminada porque queriam as nossas terras,
não aceitavam a orientação civilizada que queríamos dar à região.


Durante anos nossa nobre estirpe conduziu de maneira ética,
responsável e filantrópica, os destinos daquele povo,
e havia ali ainda uma vegetação que ainda permitia chuvas,
e a quantidade de açudes, poços e cacimbas, era proporcional à população.


Quando, devido a eventos políticos suspeitos
ocorridos às vésperas do Golpe Militar de 1964
tiraram-nos do poder, outros homens – alguns
que até que têm tênues laços sanguíneos conosco
mas dado através de fêmeas - animais mentalmente mais frágeis -,
e que, de tão tênues, os afasta da verdadeira capacidade
de serem civilizados, pois não foram criados adequadamente,
não foram acostumados, desde meninos, ao convívio com reis e aristocratas
– pois bem, outros homens foram injustamente
alçados ao mando. Ai tudo começou a dar pra trás!


Ainda menino descobri, e confirmei isso com meus pais
e irmãos mais velhos, a inveja
que minha presença despertava nos outros;
uma inveja desesperada, não essa invejazinha normal,
domável, que os nobres também têm, mas a mortal inveja dos fracos:
não suportavam a comprovação de que eu, além de ter sangue nobre,
ainda era um gênio,
acostumados a essa coisa depravada de índios de se misturar loucamente,
e que até muitos parentes meus,
inclusive irmãos, adotaram por contágio com eles.


Claro que a mistura é útil ao ser humano,
mas não assim, não essa safadeza,
essa depravação pseudovanguardista
que na realidade só serve a poderosos e selvagens;
uns por precisarem de miseráveis pra escravizar,
outros - quando não os mesmos –
por absoluta atração inata pela depravação e selvageria.


Não vou descrever aqui todas as comprovações
inequívocas e inquestionáveis da inveja que de mim nutrem
os seres diminutos que me cercam onde for,
do contrário seria preciso escrever um romance,
e a pessoas como eu o tempo é melhor usufruído
de maneira que permita a escrever apenas coisinhas curtas,
próximas da poesia e do conto,
porque também eu não iria escrever
um romancezinho qualquer, de trezentas páginas...


Bom, o fato é que, contrariando a baronesa,
eu ainda insisto em manter ligações
com o velho reino de meus antepassados
- realmente é terrível perder a majestade! -,
de forma que ainda tenho lá um pedacinho de terra,
uma loja e umas casas na rua.


Como disse, gosto das coisas antigas,
e há tempos éramos os donos do comércio local
- claro que ainda somos, que a capacidade de ganhar dinheiro é difícil de tomar-
mas não a elite da estirpe,
hoje espalhada pelo país ocupa-se de outras coisas,
sempre enriquecendo o ser humano em todas as suas possibilidades.


De forma é que mantenho lá um pequeno antiquário sertanejo,
onde se pode encontrar ainda coisas dos velhos tempos,
móveis, roupas, armas, instrumentos musicais,
apetrechos de vaqueiro e de fazenda, coisas de beatos e cangaceiros,
santos, oratórios e coisas da magia,
e naturalmente, mudas de plantas sertanejas como o cardeiro, o xique-xique,
a faveleira, a jurema, a macambira e a cajarana, entre outras.


Pois bem, o que mais vendemos ali são as coisas religiosas,
inclusive o Pão Ázimo é por nós fornecido há séculos à paróquia,
para que seja transformado pelo sagrado ritual da missa católica,
no Corpo de Cristo;
vez ou outra levamos ao bom padre relíquias vermelhas.


Mas além da Bíblia Sagrada, da Cabala e do Corão,
o Livro Capa Preta de São Cipriano, coisinhas de Exu,
raridades da Santa Inquisição e da Bruxaria,
Tratados e objetos da Mitologia,
santos da macumba e do candomblé,
orações e coisas do catimbó, incensos,
gravações de música indiana e coisas de todas as religiões orientais
e do espiritismo, tudo pode ser lá encontrado
ou encomendado e entregue em 6 dias, no máximo;
a tradição dos seis dias remonta a minha avó,
esposa do criador da loja, e tem sido mantida. Como dizia ela:
"Além de Deus ter descansado no sétimo dia,
o freguês não pode esperar uma semana!
Devemos nos apegar ao número 6;
nosso negócio é comércio, não vamos ligar pra tolices
da numerologia e da magia..."


Mas as coisas andam difíceis no comércio,
até as coisas sagradas pagam muitos impostos,
só quem ganha dinheiro no país são os políticos, magistrados e bandidos,
tanto que às vezes a gente se confunde e pensa ser tudo a mesma coisa,
de forma que, baseado no que fizera outro Barão copiando países vizinhos,
eu inventei uma loteria na loja, o Jogo dos Deuses,
que, assim como o Jogo do Bicho,
tinha 25 deuses de Afrodite a Zeus,
passando por Apolo, Baco, Buda, Exu, Jeová,
Jesus, Maomé, Iemanjá, Mefistófeles, e tantos outros.


Além de um jogo que permitia ao apostador ganhar dinheiro
e instruir-se sobre as religiões,
o Jogo dos Deuses tinha também algo astrológico,
pois que apostas eram feitas no dia anterior
e logo às 8 horas da manhã se sabia qual o deus que reinaria àquele dia.


No começo foi como não poderia deixar de ser, um sucesso.
Mas logo os invejosos começaram a aparecer e reclamar;
um queria Deus no jogo: não podia,
Deus é qualquer deus, já está dizendo, seria pleonasmo.


Outros reclamavam de Jesus não ser o primeiro,
e até me chamaram de herege
e acusaram, de novo!, que tinha parte com o Cão;
ora, o maior sinal de respeito aos deuses
é respeitar a igualdade, e eu tive que seguir portanto a ordem alfabética.


E ainda dei ao Bom Jesus o número 10, o elemento modificador,
que mais poderia fazer? Fizera de Jesus o Pelé do Jogo dos Deuses!


Uma madre veio pedir pra incluir apenas santos do catolicismo.
Queria me levar à falência...


Porém, depois que deu Mefistófeles a 23 de Dezembro,
endoideceram:
Nem adiantou o fato de eu respeitar
até mesmo a véspera de dias santos importantes
e não fazer o jogo pra evitar problemas.


Mataram 3, um a 23 de dezembro, outra a 24,
e mais um nodia 25,
e não é que quiseram me responsabilizar pelos atos dos selvagens?


O fato é que precisei extinguir,
se definitivamente ou não eu não sei,
o Jogo dos Deuses.


Mas acaso pensa o leitor que me surpreendi
com a repercussão de minha obra?
Que nada, já estou acostumado!
Desde menino sei da inveja que nutrem com relação
à minha pessoa noventa e nove por cento de quem me conhece,
homem, mulher ou seres de outros gêneros.


Até com meu nome implicavam;
queriam que eu o aportuguesasse
pra "Carlos Crédulo" - Horrível, meu Deus! –
como se fosse possível mudar o nome da nobre estirpe
da qual sou herdeiro e que chegou a Portugal
há muito tempo, vinda da Transilvânia.


Antônio Adriano de Medeiros
DOIDOS DE MIM

sexta-feira, 8 de outubro de 2010


O MOSQUITO DO TERROR
 
 
Bem sei que não estou à altura de participar de altas discussões políticas como as que se vê em nobres ambiente de nossa vida social, mas suponho que, talvez, nesse segundo turno de eleições, possam surgir exageros em fatos, artigos, opiniões ou sei lá mais o quê, exageros estes que poderiam ser considerados "terrorismo psicológico".

Alguns talvez já tenham até surgido...

De forma que ressuscitei o Mosquito.

Ele está no ar.



O MOSQUITO DO TERROR

Ele anda pelo mundo
há bem mais tempo que nós;
parece pequeno e frágil
mas dos homens é algoz;
estirpe com ancestrais
na terra dos faraós.

Eu fui com dois brocoiós
a um forró arretado
em noite muito chuvosa,
e findei embriagado.
Digam quem apareceu:
o Bem-te-vi encantado!

Disse-me o cantor alado
que nossos amigos bichos
já andavam com saudades
de nossos velhos cochichos,
e perguntou: - "Onde andaste?
Não mais foste a nossos nichos!"

Lá no sítio Carrapichos
um bom forró transcorria,
mas Bem-te-vi convidou-me
a uma festança que havia
de bichos, ali pertinho,
que durava mais de um dia.

Chamou, eu disse que ia,
e saímos escondidos;
no caminho percebi
bichos guardas destemidos,
e Bem-te-vi sempre olhava
a ver se éramos seguidos.

Perguntei: - "São proibidos
os festejos animais?",
e Bem-te-vi respondeu:
- "É casa de orientais:
é lá que está escondido
o tal terrorista audaz."

- "Por Deus ou por Satanás,
Bem-te-vi, diga pra mim:
quem é o tal terrorista
de quem você fala assim?
A Bíblia diz pra evitar-se
a casa de gente ruim."

- "Todos o chamam de Bin,
é um mosquito mutante
que faz o reino animal
mais uma vez triunfante;
ele mandou te chamar
pr'uma conversa importante."

Desde então senti constante
no peito uma apreensão:
seria o tal terrorista
aquele do avião,
e cismara de chamar-me
a dar-me alguma missão?

Mas logo soube que não:
era o Mosquito da Dengue
dançando assim meio torto
um animado merengue:
como estava embriagado,
parecia-me zambembe.

Embora andando capengue
nota-se que é respeitado:
todos lhe abrem passagem,
seu olhar é um ditado;
vem em minha direção,
me chama de "homem honrado".

Deixou-me tranqüilizado
pois disse chamar-se Edinho,
que aquele outro apelido
foi-lhe dado com carinho
em virtude de outro inseto
que usara o mesmo caminho.

Mas que era pequenininho,
só assustava à pobreza,
que os ricos civilizados
têm em sua fortaleza
outros bichos perigosos
guardados na natureza.

- "Eu pergunto, sua alteza:
diga, Mosquito, a razão
dessa festança animada,
da confraternização,
é simplesmente por causa
da recente mutação?"

- "Depois da reeleição,
vou pro 3º mandato
de rei dos bichos guerreiros
na luta com Insensato:
a suja corte de homens
de teu paísim barato.

Mas quando um humano mato
na verdade o sacrifico,
comungo o líquido vermelho
no momento em que o pico,
na celebração da vida
ao homem santifico.

E devo dizer que fico
no momento emocionado,
porque digo, caro amigo,
que o senhor é convidado
a fazer parte da elite
que na doença é cevado!"

Vi vindo pro nosso lado
um macaco muito feio,
a serpente venenosa
e jovem pombo-correio,
e senti-me meio mal
imerso naquele meio.

Percebendo o meu receio
o macaco disse assim:
- "Nobre humano, eu bem sei
que tu não gostas de mim.
Mas não te assustes, meu rei:
sou guarda-costas de Bin."

E disse a serpente enfim:
- "Sabemos que és doutor,
homem culto, inteligente,
prenhe de real valor,
e hoje à tua bondade
nós fazemos um louvor.

Que saibas, caro senhor,
que o convite, em verdade,
fora a ti feito somente,
pela tua honestidade,
para que tu possas ser
um cidadão de verdade.

Devido à nossa amizade
tão intensa e ancestral,
hoje vem te oferecer
- todo o reino animal -
alto cargo na elite
da saúde federal."

Nessa hora passei mal,
suava muito o meu rosto;
e nobre pombo-correio
percebera meu desgosto
e assim interferiu,
como que a contragosto:

- "O nobre recusa o posto
e devemos aceitar:
sabe a responsabilidade
que teria de enfrentar,
conhece as limitações
que em seu pobre ser há".

Logo vi se desformar
a mesa da autoridade,
e Bem-te-vi me chamou
pra voltarmos à cidade,
ele estava meio triste;
hoje nem sei mais se existe
a nossa antiga amizade.

Antônio Adriano de Medeiros