terça-feira, 22 de novembro de 2011
versos cactânicos
Essas folhinhas aí de cima são da faveleira, árvore de onde se retira a favela. Pelos espinhozinhos, caso a toquemos, sai um líquido deveras urticante. Havia no Arraial de Canudos um local chamado de Favela, por ter lá faveleiras. Dái que o nome pegou pra local de moradias rústicas, barracos e afins. A faveleira é uma árvore, mas bem que pode ser incluída aí nos meus versos cactânicos: t~em espinhos e veneno... absaam
VERSOS CACTÂNICOS
Nunca mais nasceriam versos ali!
Quem disse fou um especialista,
um homem de muitas letras,
e ele sabia muito
porque viera de longe
e falava coisas difíceis
e sabia amedrontar.
O problema seria no solo
e também no ar.
- "Salitre e pouca umidade",
ele disse.
O olhar das pessoas dali
que já era naturalmente triste
tornou-se de uma tristeza profunda
porque mesclada à aceitação
de um destino trágico.
Pareciam envergonhar-se
da própria existência infeliz
diante do especialista tão sábio
que já ia dizer
que quando falta o verso
falta o canto
e falta a beleza
e falta a paz
e falta a liber...
Mas eis que ouviu-se um velho cantar.
Era um velho louco, e cego e surdo,
e que portanto não sabia
da nova verdade revelada
pelo sábio especialista.
E as pessoas ouviram um verso novo.
Era um verso simples, raquítico.
Não era um verso chique,
mas era um verso xiquexique.
E portanto ainda nasciam versos ali.
Bem dali.
Versos de favela, urtiga e coroa-de-frade.
Antônio Adriano de Medeiros