quinta-feira, 1 de março de 2012

o poema suicida e o anti-poema



Felizmente tive que interromper o reinado do cordel antes da hora pois precisei atender a um visitante muito especial; ou será que eram dois?

Na verdade, há cerca de um mês vinha tentando escrever o soneto suicida, e até já iniciara um, mas não o conseguia terminar. Eis que de repente senti que era a Hora, mas aquele soneto esboçado se desmanchou, não poderia ser daquele jeito. Mesmo em se tratando de um suicídio diplomático, pois que o soneto se mataria para chamar a atenção para a riqueza da poesia que já existia além dele, um soneto suicida nunca poderia existir, visto que seria sempre um antipoema, não um poema. Daí que ele acabou se matando mesmo, sozinho, abriu mão de existir, e ao mesmo tempo surgiram eses dois aí, e eu, agradecido ao Criador por ter tido tal sacada, pus a epígrafe que retirei do Cântico dos Cânticos.

absaam




O POEMA SUICIDA E O ANTI-POEMA



"Eu dormia, mas meu coração velava.
Eis a voz de meu amado. Ele bate." Ct, 5, 2



I



Um poema matar-se é impossível.
Porque seria um gesto indelicado
com o leitor - a alma inextinguível,
na solidão do verso um aliado.
Por isso em fiquei tão desconfiado
ao ver aproximando-se de mim
um verso muito bem apessoado,
dizendo:- "A Poesia chegou ao Fim!
Se tudo já foi cantado por alguém
e a Poesia é filha e mãe do Bem,
só me resta lembrar à humanidade
que escrever hoje é pura vaidade;
pois quando a Poesia pode ser vivida
o poema diz Basta!, e suicida."



II



Se algum mérito o velho Diabo tem
é por sua incansável persistência.
Que era o Anti-Poema eu notei bem:
seus versos eram pura aparência!
Pois um poema é, em sua essência,
um gesto afirmativo, criador;
se ás vezes algum louva a decadência,
o faz com o velho charme fingidor
que sabe quê a Poesia é muito séria
para ter uma mensagem deletéria...
- Como pode a Poesia se retirar
deixando a Obra assim, pela metade?
Como, se nem essa tal de humanidade
Ela ainda acabou de inventar?



Antônio Adriano de Medeiros
mar - 2011

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