terça-feira, 21 de agosto de 2012

a matéria do poema








Nesse primeiro poema é referida uma abelha rara, da qual ouvi falar pelos habitantes, familiares de pacientes, da cidade de Jandaíra, na região do agreste do Rio Grande do Norte. É a abelha jandaíra. O que ela tem de especial? Ora, é muito especial: a jandaíra é uma abelha com a rara característica de não ter ferrão e produzir um mel agradibilíssimo. Não é uma boa metáfora para um poema? Pois bem. Tratemos então da Matéria do Poema, e do Copo d'água, soneto que dispensa comentário.

As epígrafes dos poemas, retiradas de composições da música popular brasileira, Gota d'água e Tenho Sede, têm aqui seus links musicais:

http://www.youtube.com/watch?v=YstwFuEE_aA

http://www.youtube.com/watch?v=itGx9XFAOFw


absaam




A MATÉRIA DO POEMA


          "Pode ser a gota d'água!"
               


Todo poema é feito de água,
abstrata água
que abraça e trata a mágoa,
as dores da humana alma.

A minha alma, ré condenada,
renasce límpida, nova, pura,
quando mergulha
num longo poema
com seus versos salva-vidas.

Um pequeno poema é a gota que falta
na boca da alma sedenta
ora torta e quase morta,
alma perdida e desiludida
no deserto da ingratidão.

O soneto é o mais perfeito
copo d´água
para o corpo vazio
da alma cheia de mágoa.

Um longo poema é um lago,
mário lago de água límpida,
mar de água sempre doce
para a pobre alma à deriva,
nau, fragata, que naufragava
no mundo superpovoado de insetos humanos
que expelem ingratidão,
enxame cruel de abelhas
inversas da rara jandaíra
- que só têm ferrão e não dão mel.

Todo poema está cheio d'água,
abstrata e melíflua água
que lava e nutre
as dores da humana alma,
e nos salva do abutre,
do bico adunco que nos fere o coração.

O poema é uma jandaíra d´água.
Não tem ferrão,
só água, melíflua água,
antídoto da ingratidão.



                  Antônio Adriano de Medeiros
                  João Pessoa, 20 de agosto de 2012.





O COPO D' ÁGUA

       
             "Traga-me um copo  d'água, tenho sede..."


Ontem à noite, sentindo estranha sede,
despertava amiúde, desidratado.
Bem dez vezes levantei de minha rede
e do pote copo cheio foi tragado.
Mas a tal sede, com seu espírito de porco
insistia em roubar-me a pobre calma.
Estaria aquela sede no meu corpo,
ou entranhada nas profundezas da alma?
Me levantei, acendi a lamparina
e, armado com caderno e lápis preto,
comecei a compor este soneto.
Logo a sede eis que senti mais pequenina.
E quando enfim vi o poema terminado,
me sentia inteiramente saciado.


                    Antônio Adriano de Medeiros
                    João Pessoa, 21 de agosto de 2012






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