quarta-feira, 21 de julho de 2010

MARIA DIABA - A CANGACEIRA DO SEXO



LEITURA DESACONSELHÁVEL PARA MENORES EM GERAL

Em verdade em verdade eu vos digo: trata-se de um cordelzinho curto e simples, uma peça meio cômica, uma brincadeirinha, mas que, em sendo um pouco carregado em termos sexuais, julguei por bem pôr aquele aviso lá em cima. Precisei forçar um pouco a barra em tempos verbais, num plural, e em palavras de uso comum no sertão, certas conjugações como "arrancou-la" no lugar de simplesmente "arrancou-a", pra salvar a rima. O satanismo de Maria Diaba se expressa basicamente na sexualidade (o que é um fenômeno bem sertanejo), mas também no ímpeto criminal para o roubo, o assalto, o arrastão. Cuidado com ela!

Acreditam que eu caí na risada quando escrevi que um pobre padre não pôde batizar a menina por ter sido acometido por um súbito ataque de berros caprinos, um estranho bodejado vindo de hostes espúrias? Cruz Credo, irmãos: não é que parecem existir mesmo espíritos zombeteiros em torno de Maria Diaba?

Bom, sem qualquer pretensão, apenas pra ficar mais bonito, coloquei como epígrafe um trechinho de Anjos Caídos, Harold Bloom.



A BREVE HISTÓRIA DE MARIA DIABA - A CANGACEIRA DO SEXO



"Demônios são universais e pertencem a todos os povos de todas as eras. A antiga Mesopotâmia foi particularmente infestada pelos demônios: espíritos do vento, eles podiam entrar em qualquer lugar e demonstravam feroz obsessão pelo estrago da harmonia sexual humana. A estrela desses demônios era Lilith, que mais tarde reapareceu como primeira esposa de Adão na tradição talmúdica e cabalística. Afastada pela criação de Eva, Lilith partiu para o litoral levantino e continuou sua carreira como tentadora sexual acima de todas as outras."



Quem lê as coisas que conto
e me julga um mau cristão
saiba que fui batizado
e fiz Primeira Comunhão;
aos doze fui crismado,
e já contei meus pecados
em igrejas do sertão.

Pra quê minha santa mão
registrasse pra história
quem é a Maria Diaba
e sua saga tão inglória,
eu fiz um longo jejum:
só com água e jerimum
alimentei minha escória.

Sei que fiquei na memória
de toda Santa Luzia:
quem me via ajoelhado
na igreja por três dia
se alma boa, rezava;
se alma ruim, gargalhava
julgando que endoidecia.

Ciente do que fazia
dali não arredei pé.
Tomado de Esperança
de Humildade e de Fé,
a Deus pedia perdão,
e a Sua permissão
pra falar de Lucifé.

Mulher ou homem que é
da turba de Satanás
logo que chega no mundo
já deve dar seus sinais:
Menina Maria Diaba
nasceu com dentes e, braba,
dava dentadas nos pais.

Além disso, havia mais:
a menina não chorava;
se ouvia bater o sino
a Danada gargalhava;
com seis meses de idade
surpreendeu a cidade
ao notarem que falava.

E sempre que se tentava
tal menina batizar
ocorria um imprevisto:
numa, caiu o altar;
em outra, o padre morreu;
na terceira endoideceu;
na quarta deu pra berrar...

E se resolveu deixar
pra que depois que crescesse
a menina desditada
ela mesma escolhesse
se numa Igreja decente,
na macumba ou na dos crente,
o seu batismo ocorresse.

E se deu que acontecesse
de sozinha aprender ler
aos dois anos de idade
na Cartilha de ABC.
E também acontecia
de dormir durante o dia,
despertar no anoitecer.

E viu-se preciso ser
mandá-la pro Maternal.
Logo no primeiro dia
"Maria" saiu no pau.
E, se vendo ser tão braba,
chamaram "Maria Diaba";
ela acalmou-se, afinal.

Algo de excepcional
se notou nessa menina:
se a chamam de "Maria"
ela se mostra traquina;
chamando "Maria Diaba"
a brabeza se acaba
- Vejam que estranha sina!

Na cidade pequenina
logo se ouve falar dela.
Ao valentão da escola
a Diaba deixou banguela.
Grandalhão mostrou-lhe a rola,
ela no dente "arrancou-la"
e sempre a guardou com ela.

Cansada de ser donzela
ofereceu o cabaço
a um grandalhão retardado
chamado "Canhão de Aço";
na hora em que a cobra entrou
grunhiu, babou, mas gritou:
- "Eu quero mais um pedaço!"

Aos 12 foi pro cangaço
"ressuscitar Lampião",
de chapéu e cartucheira
e uma faca na mão.
Quando a polícia a prendia
trepava a noite e o dia
e obtinha o perdão.

E logo todo o sertão
temia Maria Diaba,
a cangaceira menina
cuja fama nunca acaba:
como pode ficar presa
jovem prenhe de beleza
que com prazer se enraba?

Quando a coisa ficou braba
chamaram o Capitão Gay.
Ele até prendeu a Diaba,
mas o pau grandalhão vei...
Quando a Diaba se safou
Capitão filosofou:
- "Eu só sei que nada sei..."

E logo cresceu a grei
com a Diaba no comando.
Ladrões, tarados e putas
obedeciam a seu mando.
Nem todos eram aprovados:
só belos e bem dotados
a Diaba ia aceitando.

As jovens iam chegando,
era feita a votação.
Não bastava ser bonita
para ter aprovação:
a que de quatro ficasse
e um dos homens brochasse,
não se aceitava, não.

E faziam arrastão
em procissão e quermesse;
casas lotéricas e bancos
sempre davam boa messe.
Quando instinto ruim atiça
eles roubam até em missa...
faziam o que bem quisessem.

E como mui bem fodessem
nunca ficam presos, não.
As moças engolem tudo;
entra fundo o garanhão.
Se a tarde começa mal,
à noite tem bacanal,
e de manhã, o perdão.

Enfim rendeu-se o sertão
a este invencível Mal.
Ninguém consegue vencer
o cangaço sexual
que fundou Maria Diaba:
moça nova que se enraba,
garanhão que mete o pau.

Antônio Adriano de Medeiros

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