quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Da Beleza quando extravasa



A Beleza ás vezes cruza nosso caminho das  formas mais inesperadas, em algumas ocasiões sendo sendo tão abundante que nos embriaga por osmose. Acredito que foi o que aconteceu com o poeta Charles Baudelaire, como refere em A uma passante, soneto que segue a dois esboços de minha verve, que dizem respeito às grávidas.

Fato é que aconteceu, também, que nessas idas e vindas para tratamento de um mal que ora me acomete, acabarmos vendo gente bonita e, num hospital, outro dia defrontei uma grávida muito bela, numa sala de espera para exames de imagem. Foi tipo "uma passante", mas quando notei já tinha começado o segundo soneto - Um Soneto à Cavalona - e ainda não teve mais como não concluir a obra. 

Esse primeiro soneto, Grávida... Tem 13 anos, como eu gosto deste soneto!


absaam



GRÁVIDA

Ela carrega entre as pernas a safra
do amanhã. Traz no ventre obeso
guardado um ser que arfa, aceso
como fogo e com uma fome da Biafra.

Ela abriu as pernas para a vida
e agora cheia de graça sente
a vida grassar em si, fortalecida
vive em dobro, e por isso está contente.

Logo estará se desmanchando em leite,
mar dadivoso, para deleite
do pequeno ser que nela se nutre e nada

Mas antes lutará, gemendo obstinada,
para livrar-se da simbiótica alma gêmea,
se contorcendo de dor, explodindo de ser fêmea.


            Antônio Adriano de Medeiros
            12.10.99





UM SONETO À CAVALONA


Preciso escrever um soneto à cavalona.
Um soneto às suas pernas, às coxas, à bunda.
Um soneto pros seus cabelos, pra nuca e pra bucetona.
Um soneto para aquele corpo onde um belo rabo abunda.
Um soneto de meter a lingua nos lugares mais impensáveis,
de ser esponja no parto pra chupar a buchudona,
com os choques de ariscos complementos tão desejáveis.
- Não veja isso como um desrespeito, Senhora Dona:
Este soneto quer só dizer que você é uma delícia;
queira aceitar cada verso como perfeita carícia
- safada! - Sua beleza atual precisava ser cantada.
E um poema vem dizer, de forma bem comportada,
de como eu gosto, minha amiga, de apertar a sua mão,
de contemplar o seu rosto, de olhar o seu rabão.


                        Antônio Adriano de Medeiros
                        17 de outubro de 2012





A UMA PASSANTE

A rua em torno era um frenético alarido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.

Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre ef ina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.

Que luz… e a noite após! – Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?

Longe daqui! tarde demais! “nunca” talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!]



BAUDELAIRE, Charles. As flores do mal.
Tradução, introdução e notas de Ivan Junqueira.
Edição biligue. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.




A une passante

La rue assourdissante autour de moi hurlait.
Longue, mince, en grand deuil, douleur majestueuse,
Une femme passa, d’une main fastueuse
Soulevant, balançant le feston et l’ourlet;

Agile et noble, avec sa jambe de statue.
Moi, je buvais, crispé comme un extravagant,
Dans son oeil, ciel livide où germe l’ouragan,
La douceur qui fascine et le plaisir qui tue.

Un éclair… puis la nuit! – Fugitive beauté
Dont le regard m’a fait soudainement renaître,
Ne te verrai-je plus que dans l’éternité?

Ailleurs, bien loin d’ici! trop tard! jamais peut-être!
Car j’ignore où tu fuis, tu ne sais où je vais,
O toi que j’eusse aimée, ô toi qui le savais!



                       charles baudelaire
                       fleurs du mal