terça-feira, 11 de setembro de 2012

Do Zoológico Fantástico - A Escola da Floresta


Acima flagrante de um momento de rara dedicação aos estudos, de um dos alunos da Escola da Floresta.


Também para amenizar mais a coisa por aqui, que a barra andou pesada, mas sobretudo atenendo ao pedido de amiga mui querida - ela quer ler mais poemas do Zoológico Fantástico, a engenheira preciosa - segue um antigo poema Zoo, dos primordiais, dos pilares do Zoológico, a Escola, a Universidade dos Bichos.

Não foi em um dia normal que me chamaram a conhecer a UFAN, universidade federal dos animais, mas sim eum um dia com performance de arte na biblioteca central, e os bichos mais chegados às artes estavam ouriçadíssimos. Tinha show de rock e tudo mais. Interessante que, assim como nos campi humanos, ali a coisa começou com mais repressão, mas depois relaxo: "o coral das arapongas começou séria a noitada, mas depois rolou um rock com a turma da macacada..."

O leitor não vá estranhar a abundância de professores da espécie asinina: Jegue, Jumento, etc. As semelhanças com a academia humana são bem reais.

Tive a honra e o prazer de receber aula especial de Mestre Professor Jumento, o mais respeitado dos catedráticos daquela academia. As lições me pareceram um tanto ou quanto equivocadas e mesmo paradoxais, mas todo conhecimento deve ser respeitado.

Rolou uma paquera danada na hora do rock...

Em nada ficou-se devendo á nossa humana Academia. Se paquerei? ah, deixa pra lá! Fui com mais nobres intenções...

absaam



ZOOLÓGICO FANTÁSTICO




 VIII

A ESCOLA DA FLORESTA

Cruzando a Barba do Bode,
passando o Boi Encantado,
depois da Baixa da Égua,
- tem que se andar um bocado -
é que o templo da burrice
se encontra localizado.

Lá somente é ensinado
conversa pra boi dormir;
papagaio faz palestra,
junta burro pra assistir:
da escola da floresta
vou contar tudo que vi.

Quem me guiou foi Saci
- que conhece tais quebradas -.
Vi hienas macumbeiras
rindo nas encruzilhadas,
e dez cachorras doentes
correndo desembestadas.

Todas as coisas narradas
nesse presente momento
foram ali vivenciadas
com muito contentamento;
pedi pra contar a história
e tive o consentimento.

Mestre Professor Jumento
ensina filosofia,
o Burro é o catedrático
supremo da economia,
e a Mula Sem Cabeça
a mestra na poesia.

Égua a psicologia
aos alunos ensina,
Doutor Jegue é o decano
do curso de medicina,
Urubu é latinista,
só dá aula de batina.

O veado é gente fina
e sonha em ser antropólogo,
o rato estuda direito,
o gato quer ser biólogo;
porco é doutor em política,
e o cão, grande teólogo.

O ilustre paleontólogo
tiranossauro é reitor;
asno mostra a todo mundo
seu diploma de doutor;
raposa não fez concurso:
é prima de um senador.

Papagaio é orador
muito bem conceituado,
pavão é um professor
com fama de ultrapassado,
e piranha levou pau
de novo o ano passado.

Quando o pátio está tomado
por galinhas juvenis
macaco se entusiasma,
fica contente, feliz,
e geralmente tem briga
entre a turma dos saguis.

Nos grêmios estudantis
preguiça é quem se destaca;
nos intervalos das aulas,
- lá na cantina da vaca -
a paquera rola solta
de guaxinim com macaca.

Comi tripa com ticaca
que abutre nos preparou,
e fui pra biblioteca
com engenheiro castor,
onde nosso amigo urso
nos viu e nos abraçou.

Veado então se chegou,
- tinha performance de arte! -
ouriçado e triunfante,
e olhando pra toda parte;
paca estava de odalisca
toda verde, - era de Marte.

Cachorro de bacamarte
veio fazer presepada
e o coral das arapongas
começou séria a noitada,
mas depois rolou um rock
com a turma da macacada.

A Chita entusiasmada
caprichou na bateria;
Tarzan veio dar uns urros
- ele ensina ecologia -,
um gorila na guitarra
tocava, e se remexia.

Lá teve música e poesia,
dança, teatro e pintura;
papagaio discursou:
- "Agora ninguém segura,
que o mundo fique sabendo:
o bicho é que tem cultura!”

A roliça tanajura
dançou rebolando o tchan;
elefante expôs seus quadros,
declamou versos a rã;
foi representada a peça
Os Burros do Amanhã.

O professor Acauã,
como sempre pessimista,
reclamou contra a presença
da "abelha comunista",
que trouxe comida típica:
mel pra vender a turista.

O gorila guitarrista
depois de beber cachaça
por pouco não faz a festa
acabar numa desgraça
dando em cima da cadela
de um cachorro de raça.

Quem me deu aula de graça
foi o Professor Jumento:
disse que tinha o instinto
mais valor que o sentimento,
defendeu a força bruta,
desprezando o pensamento.

Transmitiu-me o ensinamento
filosófico animal:
que levar vantagem em tudo
é a regra principal;
até citou Charles Darwin
e a Seleção Natural.

Diz que só existe o mal
quando reina a liberdade;
que nada vale o indivíduo
perante a comunidade,
e está no livre-arbítrio
a luz da humana maldade.

Defendeu a falsidade,
a astúcia e a roubalheira,
que esse negócio de ética
não passava de besteira;
se disse o grande guru
da política brasileira.

Falou que em qualquer feira
hoje se compra diploma,
basta o bicho ter no bolso
dinheiro em certa soma;
e que o bom diplomado
é aquele que embroma.

Fez elogios a Sodoma,
a canibais e à orgia,
e disse que se algum bicho
nega essa filosofia,
deve voltar para a selva:
que fosse fazer poesia!

Agradeci com alegria
esse e outros favores,
e pedi consentimento
pra contar a meus leitores
como são inteligentes
os burricos sorridentes,
os nossos bichos doutores.


              Antônio Adriano de Medeiros